As vacinas contra a Covid-19 usadas no Brasil passaram por testes obrigatórios, que conferem sua eficiência e segurança, e foram aprovadas pela Organização Mundial de Saúde (OMS) e pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Apesar disso, existe um movimento antivacinação – felizmente, pouco influente no Brasil – que espalha desinformação para tentar desacreditar os imunizantes que reduzem fortemente as chances de infecção e, sobretudo, de complicações e mortes pela Covid-19. As maiores fontes dessa desinformação – que inclui mentiras, como a presença de chips mortais nas doses de imunizante – são influenciadores da extrema-direita nos Estados Unidos. É o caso de uma modinha que começa a se espalhar pelas redes sociais brasileiras, a dos “transvacinados”.
O termo une o negacionismo sobre os imunizantes e sobre a gravidade do coronavírus a um ataque às pessoas transexuais. Quem busca nas redes a versão em inglês, “transvaccinated”, é direcionado a perfis de apoiadores radicais do ex-presidente dos EUA Donald Trump que tentam emular o discurso de pessoas trans para dizer que se sentem imunizados.
Em um dos vídeos mais compartilhados (com milhões de visualizações), um rapaz explica, em inglês, que “uma pessoa transvacinada é alguém que nasceu no corpo errado”. O suposto negacionista (suposto, pois não fica claro se é ou não uma peça humorística) diz: “Eu nasci no corpo de uma pessoa não vacinada, mas eu sabia, desde criança, que deveria estar em um corpo vacinado. Então, eu me identifico como uma pessoa vacinada”.
Quem busca o termo “transvacinado” nas redes brasileiras é direcionado para informações sérias sobre os imunizantes e sobre a Covid-19. Veja este exemplo no Twitter:
Nos resultados, porém, também aparecem brasileiros que estão “importando” essa onda negacionista dos EUA, em um movimento que já vinha ganhando corpo em redes com pouco controle, como o TikTok, e está sendo amplificado pela adesão de influenciadores de peso, como a deputada federal Carla Zambelli (PSL-SP), que divulgou o seguinte material para seus 1,3 milhão de seguidores no Twitter, no último domingo (26/9):
Carla zambelli espalha desinformação sobre a vacina contra a covid: transvacinados
A mulher no vídeo divulgado por Zambelli é a influenciadora Ana Paula Palagar, que faz forte campanha contra o “passaporte da vacinação” e esteve presente nos atos bolsonaristas de 7 de setembro com uma camiseta temática (imagem em destaque). Sua influência digital era pequena até a adoção do termo “transvacinada”, mas, ela agora cresce nas redes, no rastro dessa nova polêmica negacionista – e desrespeitosa às pessoas trans.
É, pessoal. Tem sido um ato de muita bravura autointitular-se “ser humano” com certas coisas que vemos por aí. Muitas vezes, o sentimento de vergonha é dominante… mas, fazer o que? Seguimos em frente. A nova onda da galera antivacina é o movimento “transvacinados”. Não entendeu nada? A gente explica.
De cunho transfóbico e, pode-se dizer, burro, os “transvacinados” se chamam assim porque, de acordo com eles próprios, “se sentem vacinados em um corpo não vacinado”. O discurso faz alusão a como uma pessoa trans é comumente referida num contexto social (“sente-se mulher num corpo de homem” ou “sente-se homem num corpo de mulher”). Mas qualquer pessoa bem informada (e bem intencionada) sabe que esse dito popular é errado e preconceituoso (saiba mais ao final do texto).
A jovem Ana Paula Palagar, que se considera “influenciadora digital” e tem em sua conta nas redes sociais a hashtag #FechadaComBolsonaro, viralizou após aparecer em vídeo justificando o movimento. Ela vestia uma camiseta com os dizeres: “Transvacinado. Me sinto vacinado em um corpo não vacinado”.
Ana Paula estava nas manifestações do 7 de setembro quando respondeu a perguntas para um vídeo. “Eu estou na luta pela liberdade, que é a maior falta de todos que vieram aqui. Então, da mesma forma eu vim lutar pela liberdade, até porque o que vem ocorrendo no Brasil é uma falta de liberdade e falta de democracia”, disse.
Depois, a jovem foi questionada sobre o significado do que estava escrito em sua roupa.
“Esse movimento, transvacinado, está no mundo todo. São pessoas que se sentem vacinadas mesmo não tendo um corpo vacinado. E a gente quer respeito sobre isso. A gente quer que as pessoas respeitem a nossa visão e o nosso sentir de estar vacinado. Esse é o movimento de transvacinados, não só no Brasil, como na Espanha, na França, nos Estados Unidos, e está se espalhando pelo mundo todo. Da mesma forma que pessoas são respeitadas como trans, nós também queremos ser respeitados”, afirmou.
Ao final, a entrevistadora questiona por qual motivo ela acredita que estaria imunizada sem ao menos ter tomado uma das doses das farmacêuticas.
“Pelo simples fato de eu me sentir com saúde, de eu me sentir imunizada”, encerrou Ana Paula.
Transfobia
A informação é sempre a melhor arma contra o preconceito! O movimento “transvacinados” não é só burro e anti-ciência, é, também transfóbico.
Após perceber-se com um gênero diferente do que lhe foi atribuído ao nascer, uma pessoa transgênero passa a enfrentar uma verdadeira luta para viver sua identidade. Especialmente no Brasil, onde casos de transfobia são recorde mundial.
Apesar de ter o dobro de tempo na Terra, a sociedade brasileira parece não ter tido tempo para se informar sobre identidade de gênero corretamente e continua a perpetuar tratamentos transfóbicos.
Informações: Metropoles/ Catraca Livre