Moradores de Heliópolis acusam polícia de alterar cena de morte; PM diz que vazamento de água ‘arrastou vestígios’

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Moradores de Heliópolis, na Zona Sul de São Paulo, contestam a versão da Polícia Militar sobre a ação do último domingo (1º) durante um baile funk que terminou com um homem morto a tiros. Para eles, a PM limpou a cena do crime.

A ação policial se deu no mesmo dia em que nove jovens morreram durante outra ação da PM em baile de Paraisópolis, também na Zona Sul da capital.

A morte do homem de 38 anos em Heliópolis, identificado como Alberto Gois, se deu em decorrência de choque hemorrágico, segundo laudo do IML, após ele ser atingido de frente por dois tiros, um no peito e outro na barriga.

De acordo com o boletim de ocorrência, com base em informações da polícia, o homem foi baleado por PMs em uma viela, a viela de São Jorge, após correr em direção a eles com uma arma em punho e atirar.

O BO informa que o homem estava “provavelmente fugindo da ação de dispersão que era feita do outro lado da comunidade [por outra equipe da polícia]” durante o baile funk

No boletim também consta que:

  • “o local [dos disparos] foi totalmente prejudicado em razão de um cano furado provavelmente por um disparo, que provocou um grande vazamento de água que arrastou vestígios”;
  • “outro prejuízo para a preservação se deu por conta da atuação dos bombeiros que entraram no beco e realizaram procedimentos de praxe”;
  • um sargento desarmou o homem morto, guardou o armamento consigo e o apresentou à delegada, que determinou que “realimentasse a arma apreendida e a recolocasse de volta ao local da forma que a encontrara“.
Trecho do boletim de ocorrência sobre a morte de homem baleado por policiais durante ação em baile funk de Heliópolis, em São Paulo — Foto: Reprodução

Moradores de Heliópolis ouvidos pelo G1, no entanto, contestam a versão da polícia sobre o momento dos disparos e afirmam que o homem foi levado para um beco por PMs, dentro de uma viatura, sem troca de tiros. Um dos moradores contou que, após retirar o homem de dentro do carro, a polícia efetuou os tiros no mesmo instante em que era disparada bomba de efeito moral.

Ainda segundo os moradores, nenhum cano foi estourado na viela, e policiais alteraram a cena do crime limpando o local.

“Tiraram o menino da viatura, levaram para o beco e atiraram no menino. Depois lavaram o beco antes da perícia chegar”, disse um morador que não quis se identificar por questão de segurança.

Segundo os policias, o homem baleado foi socorrido com vida após a suposta troca de tiros com policiais e encaminhado para o pronto socorro do Hospital Heliópolis. Uma mulher que mora na comunidade, no entanto, já havia relatado para a TV Globo que o corpo do homem ficou no mesmo local até a manhã de domingo, não tendo sido levado ao hospital com vida.

“Ia dar sete horas da manhã e o corpo do menino jogado para dentro do beco. E eles [policias] estavam fumando cigarro, conversando, sorrindo. Não estavam sentindo nenhuma dor pela morte do jovem”, disse a moradora.

Procurada pelo G1, a Secretaria de Segurança Pública afirmou por meio de nota que “todas as circunstâncias relativas à ocorrência em Heliópolis são apuradas pela Polícia Civil (95º DP) e pela Corregedoria da Polícia Militar. O DHPP instaurou inquérito para apurar a morte decorrente de intervenção policial ocorrida no dia 1º de dezembro”.

PM alega ter sido hostilizada em baile

Os policiais militares afirmaram que no domingo, antes de o homem ser baleado e morto, entraram em Heliópolis ao perseguir um rapaz em uma motocicleta que tentou fugir para o interior da comunidade. Essa informação também consta do boletim de ocorrência.

Segundo eles, quando se aproximaram da rua onde acontecia o “pancadão” teriam sido “hostilizados e atacados com pedradas e garrafadas” e, por isso, utilizaram “munições químicas para dispersar a multidão e fazer cessar as agressões”.

Ainda de acordo com a versão da polícia contada no boletim de ocorrência, diante da correria e do ataque a policiais feito por quem estava no baile, PMs começaram a “averiguar vielas” para garantir a segurança do local. Neste momento, na versão da polícia, que agentes se depararam com o homem que acabou baleado e morto.

A identificação da vítima, Alberto Gois, só foi feita no IML.

Vídeo agressões

Um vídeo também mostra policiais agredindo jovens com cassetetes em uma viela. Sobre as imagens em que os policiais aparecem batendo nas pessoas, o porta-voz da PM, tenente-coronel Emerson Massera, afirma que “o que sugere as imagens é que as pessoas não tinham para onde fugir e os policiais não observaram técnicas”. “A PM vai analisar essas imagens”.

Na manhã desta quarta-feira (4), a Ouvidoria da Polícia entrou com pedido de afastamento dos policiais que aparecem agredindo e encurralando as pessoas em uma viela durante o baile funk em Heliópolis.

“São imagens de agressão e abuso”, afirmou o ouvidor da Polícia, Benedito Mariano.

Fonte: G1

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