Lady Gaga no arrocha: remix com Pabllo Vittar tem som ‘100% Brasil’ e sanfoneiro de ‘Ai se eu te pego’

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Lady Gaga caiu no arrocha com Pabllo Vittar. O remix de “Fun tonight” é tão doido quanto seus bastidores: o projeto trocou o som da boate pelo do paredão, o sanfoneiro de “Ai se eu te pego” tocou sem saber do que se tratava e Pabllo fez uma dissertação para Gaga sobre forró e brega.

A faixa faz parte do álbum “Dawn of Chromatica”, lançado nesta sexta-feira (3), com remixes que também incluem Charli XCX, Blackpink, Rina Sawayama, Bree Runway e Arca.

Ouvir Gaga e Pabllo arrochando com uma sanfoninha de forró parece um sonho de um fã brasileiro ou uma dessas montagens inusitadas no YouTube. Veja, em 7 passos, como o delírio se tornou real:

  1. Em abril desse ano, piscou na DM do Instagram de Pabllo uma mensagem de Michael Tucker, o BloodPop, produtor de Lady Gaga, com o convite para o álbum de remixes de “Chromatica”.
  2. Os produtores brasileiros da Pabllo piraram: eles discutiram e ficaram sem dormir. Decidiram fazer propostas diferentes para começar a trabalhar.
  3. Eram duas ideias: uma de house music e outra com base de arrocha e toque de forró, apelidada internamente de “versão brasileira Herbert Richers”. Pabllo foi nessa, a brasileira, sem dúvida.
  4. Para caprichar no toque de forró, eles queriam um instrumento real, não sintetizado. Chegaram a William Santos, o cara que gravou o acordeon do megahit “Ai se eu te pego”, de Michel Teló.
  5. Como o projeto com Gaga era secreto, eles tiveram que fazer uma versão falsa da música em português, e William gravou sem saber que era para Lady Gaga.
  6. Será que Gaga ia ouvir o forrozão, coçar a cabeça e pensar: ‘Yukê?’ Para evitar a dúvida e explicar do que se tratava, eles mandaram o arquivo junto com um texto em que Pabllo conta suas origens nesses estilos e inclui links do YouTube para explicar que, no Brasil, muita gente escuta hits de Gaga em remixes piratas de forró, brega e arrocha.
  7. Foram 5 dias de ansiedade até a resposta do time de Gaga: “awesome” (incrível). E só um pedido: aumentar a presença da voz de Pabllo na faixa. Yukê? Sucesso.

Uma Gaga no paredão

A bendita DM de BloodPop chegou enquanto Pabllo e o time ainda se preparavam para lançar o clipe de “Ama sofre chora”, que abriu o projeto do EP “Batidão tropical”.

“Se eu estou no álbum de remixes da Gaga é por causa dos ‘vittalovers'”, diz Pabllo sobre seus fãs. “Eles ficaram chamando atenção do Blood no Twitter”, ela agradece. Há também relatos de que a inglesa Rina Sawayama, amiga do produtor e que já trabalhou com Pabllo, reforçou o convite.

De qualquer forma, lá estava a mensagem com um link para baixar e retrabalhar os elementos da música. “Foi uma coisa bem informal mesmo”, conta Pabllo. Ele não dizia nem o prazo.

“A parte que ninguém sabe é o desespero: o que a gente vai fazer, como a gente vai fazer? A responsabilidade era um monstro. Não dormi por dois dias“, confessa Zebu, parte do quinteto dos produtores Brabo Music, junto com Pablo Bispo, Maffalda, Rodrigo Gorky e Arthur Marques.

Eles montaram as opções (conheça no vídeo acima a versão house que foi descartada). “A Pabllo ouviu e falou: ‘não, Brasil, Brasil. É isso aqui e acabou.’ Eu sempre achei que tinha que ser essa também. Todos nós”, conta Zebu.

Brasil plural

Já vai ter muita eletrônica nesse álbum de remixes. Então eu queria levar o meu Brasil, levar o arrocha, as pitadas de forró“, diz Pabllo.

Ela poderia também ter feito algo mais clichê, que já estivesse no pacote iniciante de Brasil para gringos: samba, bossa-nova, até funk… Mas o objetivo era outro:

“[Eu quis] quebrar essa bolha, mostrar que a gente é muito plural, tem muita coisa legal, muitos ritmos incríveis, como o forró, o arrocha, o calipso, o brega. Eu tenho explorado isso muito nos meus últimos trabalhos e eu tô muito feliz de esse remix ter entrado nesse álbum tão importante da Gaga”, diz Pabllo.

E tem mais: além dos ritmos do Norte e do Nordeste, o álbum original da Gaga, de 2020, também mora no coração da Pabllo: “‘Chromatica’ foi muito importante para mim, porque foi lançado no meio da quarentena, então foi uma válvula de escape, eu escutava muito”, lembra.

Pablo Bispo, Zebu, Maffalda, Gorky e Arthur Marques são os produtores e compositores da Brabo Music; eles assinam a produção de 'Batidão Tropical' — Foto: Reprodução/Instagram/Zebu

Pablo Bispo, Zebu, Maffalda, Gorky e Arthur Marques são os produtores e compositores da Brabo Music; eles assinam a produção de ‘Batidão Tropical’ — Foto: Reprodução/Instagram/Zebu

Pabllo: origens

“Não se escuta forró lá fora, bem como antes não se escutava funk, ou reggaeton. Não tem como o som chegar lá fora se ninguém fizer. Então, se a gente tem uma artista que tem coragem de fazer desse tamanho, que recebe uma ligação da Lady Gaga e aceita, vamos fazer”, diz Zebu.

“Ela poderia fazer um house, poderia se adaptar muito. Não que não sejam lugares em que ela já foi”, argumenta Zebu. Mas o que fez sentido para ela foi “o Brasil 100%”.

“Fecha um ciclo muito legal”, diz Gorky. “O início da carreira da Pabllo foi a gente produzindo versões brasileiras de música pop gringa. No começo era tudo não oficial, feito ali escondido… ” Pabllo estreou em 2015 com um EP de versões de Major Lazer, Beyoncé e Rihanna – sem autorização, claro.

“Agora, oficialmente, a gente fez uma coisa que é extremamente a cara da Pabllo, extremamente a cara do Brasil, e, ao mesmo tempo, dá uma abertura grande de fazer esse tipo de som com letras em inglês e pensando no mercado fora”, projeta Gorky.

Ai, se eu te conto…

Zebu ficou feliz quando recebeu o contato de William e soube que ele gravou “Ai se eu te pego”, a “sanfona mais famosa do mundo”. “Só que tinha uma questão. Eu não posso mandar a música pro cara. Porque isso não pode vazar de maneira nenhuma.”

A solução foi escrever uma letra em português e mandar para William como se não fosse nada. “E era horrível a letra”, diz Zebu, aos risos (ouça no vídeo acima). Mas bastou para despistar o dono do acordeon, que gravou sua parte.

William só ficou sabendo que tinha tocado em uma música de Lady Gaga a dois dias do lançamento: “Que loucura. Eu não sabia, ele não me contou. Só falou esses dias para mim pelo ‘Whats’. Eu falei: ‘Uau’, fiquei sem entender nada, mas feliz de participar desse trabalho”, diz.

Pabllo Vittar resgata memória afetiva em 'Batidão Tropical' — Foto: Divulgação

Pabllo Vittar resgata memória afetiva em ‘Batidão Tropical’ — Foto: Divulgação

‘A sanfona torando e a Gaga gritando’

Até a harmonia da música Gaga e dos sons da infância de Pabllo combinaram. “”Fun Tonight’ tem uma harmonia que é a mais comum, tipo ‘Let it Be’ (dos Beatles):. Dó, Sol, Lá Menor e Fá. E também é muito usada em forró. Tava certo que era para ser isso”, diz Zebu

Mas eles deram uma enxugada na música. “A gente mudou a estrutura. Para ter esse poder de vir, ‘bum’, logo na sua cara. A gente cortou o primeiro verso”, expilica Gorky.

“A outra (versão) demorava para ficar legal, essa já fica no começo. A sanfona torando e a Lady Gaga gritando em cima”, descreve Zebu, empolgado.

Toque de Maffalda

Além do acordeon, a faixa tem sons orgânicos de guitarra e, com mais destaque, o saxofone de Will Bone, músico que grava o instrumento em várias faixas de Pabllo.

A base eletrônica arrochada vem de outro membro da Brabo Music: Arthur Gomes, o Maffalda. As viradas vieram do remix maroto de “Infinity”, acid house de 1989 do DJ inglês Guru Josh, que virou um arrocha popular no YouTube nas mãos de Maffalda.

Carta de intenções

Para ajudar Lady Gaga e BloodPop (que também ja produziu Britney Spears, Justin Bieber e Madonna) entenderem a doideira do remix, os produtores e Pabllo mandaram a resposta para o produtor com o arquivo e um texto explicativo.

“Era algo do tipo: olha, aqui está o remix que eu fiz com os meninos, que mostra tudo o que eu sou. É extremamente influenciado por música brasileira e aquilo em que eu acredito. É uma coisa muito maior do que eu, é uma das minhas grandes influências'”, conta Gorky

“Aí a gente pegou alguns exemplos: ‘isso é normalmente como a gente escuta música pop gringa aqui no Brasil. E a gente pegou as próprias coisas da Gaga em versão forró. E falou: ‘Olha é isso aqui'”.

Havia um argumento extra: uma das inspirações de “Chromatica” é a estética de filmes sci-fi como “Barbarella” e “Star Wars”. “Esses filmes sempre têm um planeta tropical”, diz Zebu. “Tem até uma ‘steel drum’ (intrumento comum na música latina) que dá aceno meio dominicano no negócio”.

Juntas e shallow now

A resposta do produtor de Gaga demorou cinco dias e foi melhor que a encomenda. Além do “incrível”, veio um pedido para ser menos discreto.

“A gente foi um pouco conservador na primeira versão em termos de vocal da Pabllo, porque a gente estava com medo de tirar o lugar da Gaga na música. Então a gente fez como se a Pabllo entrasse como um ‘feat'”, lembra Gorky.

“A gente recebeu dois feedbacks: ‘o remix tá incrível, mas a gente sente falta de mais Pabllo.’ E aí o ‘feat’ virou um dueto. Se você contar milimetricamente, Pabllo e Gaga estão cantando meio a meio a música”, diz o produtor.

Na véspera do lançamento, Lady Gaga marcou a brasileira no Instagram e BloodPop elogiou no Twitter: “Pabllo Vittar é uma estrela”.

Bloodpop, produtor de Lady Gaga, elogiou Pabllo Vittar — Foto: Divulgação/ErnnaCost e Lisa Lake/Getty Images North America/Getty Images via AFP

Bloodpop, produtor de Lady Gaga, elogiou Pabllo Vittar — Foto: Divulgação/ErnnaCost e Lisa Lake/Getty Images North America/Getty Images via AFP

Informações: G1

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