‘Do carro da Pitú à volta da festa no chão’, veja um apanhado de fatos marcantes da Micareta de Feira

165508-3

Com 53 anos de idade, e mais de 45 micaretas no currículo, Edilson Veloso, professor de educação física, radialista e pesquisador de música é um grande entusiasta e conhecedor da festa. Quase um “Google” ambulante do carnaval fora de época, ele tem em seu arquivo lembranças, fatos inusitados e muitas vivências micaretescas.

Em entrevista ao Acorda Cidade, o professor Veloso, como é carinhosamente chamado por amigos e alunos, relembrou momentos de micaretas passadas e fez uma análise do cenário atual da festa. Para ele, ao longo dos seus 82 anos de vida, a festa e os foliões precisam se reinventar e se ressignificar. O passado deixou a sua história, mas o presente pode surpreender e trazer novas configurações para a festa.

Veloso conta que o seu amor pela Micareta começou quando ainda era bebê. Acredite! Depois que seu pai biológico abandonou sua mãe, ele e o irmão gêmeo foram morar na garagem de um trio elétrico. O sentimento pela micareta foi forte na infância e ele recorda que depois que foi adotado passou a morar na Rua Tertuliano Carneiro. O local era onde a festa acontecia e também onde ficavam os trios elétricos. Havia hotéis para hospedar os artistas e aos seis anos de idade ele brincava de ficar achando os trios.

“Eu achava aquilo o máximo e quando os trios iam embora eu até chorava, sentia saudades. Com 8 anos eu já acompanhava o trio até a Igreja dos Remédios e com 10 anos eu já estava no meio do povão. Assim eu me apaixonei pela Micareta”, comentou.

Caetanave

O professor relatou ao Acorda Cidade que um dos momentos mais marcantes foi quando em 1977 ele viu o trio de Dodô e Osmar pela primeira vez. Quando assistiu também a apresentação do trio futurista Caetanave em Feira de Santana. O trio foi construído por Orlando Tapajós e era uma homenagem a Caetano Veloso, após o cantor voltar do exílio em Londres. Tinha simbologias culturais, políticas e era a grande sensação do momento.

A amizade com o cantor Ninha, ex-Timbalada, também é algo que faz vibrar o amor que Veloso tem pela Micareta e ele diz que ficou emocionado quando em 2005, de cima no trio, no auge da Timbalada, Ninha o saudou e disse que o considerava um grande irmão. A amizade se fortaleceu e o artista sempre vem a Feira de Santana prestigia o amigo com uma visita à sua casa e um bate-papo musical.

O Carro da Pitu, grande fenômeno da Micareta

Edilson Veloso opina que o maior fenômeno da Micareta de Feira chamava-se ‘Carro da Pitu’, um veículo veraneio, plotado com várias propagandas do aguardente e que tocava som mecânico. Particularmente, apenas uma música, a canção “Chora Bananeira”. Segundo Veloso, o ‘Carro da Pitu arrastava uma multidão de mais de 10 mil pessoas e era a sensação da festa. O público se esbaldava no refrão “Chora bananeira, bananeira chora, chora bananeira, o meu amor já foi embora’ e o carro chegava à praça João Pedreira na Getúlio Vargas por volta das 18h e não tinha hora para acabar a folia.

“Os foliões não deixavam o carro parar e uma volta na praça era uma eternidade. O carro andava a uma média de 5 Km/h. O carro da Pitu fez muito sucesso e seguiu se apresentando na Micareta até a década 80”, contou.

Para o professor, outro grande marco da Micareta de Feira era a presença do Chiclete com Banana. A banda estourou grandes sucessos na cidade e além de puxar blocos, comandava várias festas tradicionais como o baile Caju de Ouro. Feira de Santana também foi o local onde houve a primeira dissidência do Chiclete com Banana. Em 1986 o cantor Missinho rompeu com a banda em plena Micareta. Houve uma discussão, ele desceu do trio e nunca mais voltou.

Saudades e vivências do presente

Edilson Veloso embora tenha muitas saudades das Micaretas passadas, de vários momentos que viveu durante a festa, não deixa de apostar no momento atual da Micareta, embora o mesmo seja alvo de duras críticas de várias pessoas. Para o professor, a Micareta atual está em processo de ressignificação, ela passou por momentos difíceis justamente para que aconteça a volta da festa rua, do povo no ‘chão’ e sem cordas.

“Tem dois anos que eu venho dizendo que essa mudança vai chegar ao seu ápice de até cinco anos e eu acredito que em quatro anos a gente consiga chegar ao resultado do folião de volta a festa no chão. Esse ano tem tudo para ser mais um passo bem largo e é preciso que as pessoas tenham paciência. Está se falando muito que só tem um camarote, mas a tendência é todo mundo voltar para o chão. No dia que todo mundo voltar para o chão, talvez até se descubram coisas novas. As pessoas precisam entender que a melhor fantasia de micareta é a que a pessoa faz. A Micareta tem que se reinventar, mas para se reinventar, as pessoas que brincam a festa devem se reinventar também, no sentido de contribuir com a festa, ao invés de só criticar. Tem que ter pessoas no poder público que gostem da festa de preferência que amem a festa e entendam que podem aprender sobre ela. Tivemos gestores que não deram a mínima importância para micareta e não estavam nem aí. Por essas pessoas, a festa acabava e não acabou ainda por causa da força do povo”, salientou.

A extinção da quarta-feira de Micareta

O fim da quarta-feira de Micareta, dia não oficial da festa que foi decretado pelo prefeito Colbert Martins da Silva não agradou a Edilson Veloso. Para ele, a decisão foi muito dura, não lhe convenceu e não houve nem sequer um diálogo mais flexível sobre a continuidade desse dia da festa.

“Considero ofensiva. Era o dia do samba. Bastava o prefeito dizer que ia deixar a quarta-feira como um dia alternativo. Os argumentos, na minha opinião, caíram por terra”, acrescentou.

Festa no Largo dia 24

Sem a quarta-feira de Micareta no circuito Maneca Ferreira, Veloso e um grupo de artistas se reuniram e vão promover no dia (24), no Largo São Francisco no bairro Kalilândia a quarta-feira alternativa de Micareta. O objetivo é dar continuidade ao início da festa de forma não oficial, como uma prévia e como forma de brincar e dar boas vindas a folia no dia (25).

As novas configurações da Micareta não interferem o sentimento de carinho e admiração que Veloso tem pela festa. Tanto que ele finaliza dizendo que se um dia a houver a possibilidade da festa acabar prefere morrer.

“No dia que a Micareta acabar eu posso morrer junto. Quero que o meu caixão seja colocado em cima de um trio elétrico, de preferência o Caetanave” declarou.

OUTRAS NOTÍCIAS